FÁBIO CAMPOS: A REALIDADE NUA E CRUA
Tudo o que já escrevi sobre insegurança pública não tem um décimo da força e do impacto contido em relatos como o que se segue. O texto é de autoria de um professor que trabalha em escolas públicas de Fortaleza. É a absurda realidade. Nua e crua. Omito o nome do professor.
“Tenho acompanhado com atenção sua
coluna e considero de extrema pertinência o destaque com que o senhor
tem abordado o tema violência, problema este que nos aflige e hoje ocupa
nossas maiores preocupações. Sou professor de escolas públicas.
Vivencio na periferia o cotidiano de bairros marcados pela violência em
seu nível mais extremo.
Uma das escolas em que leciono situa-se
no bairro Vila Velha. Nela, alunos e funcionários, por morarem no
bairro, fazem diariamente relatos de atrocidades que ocorrem na
vizinhança. Atos praticados com o mais puro requinte de crueldade.
Relatam, porém, com um misto de assombro e de euforia, se não com
deleite.
Vale dizer que o caso assusta não só por
se tratar de homicídios, mas pela forma como estes são praticados;
assombra também a reação que desperta nos adolescentes e até nos
adultos, comprovando a banalidade com que tratam a vida, a morte, a
violência em si.
Durante o ano de 2012, tivemos 4 alunos
entre os 32 jovens mortos no bairro. Já outros dois ou três, perdemos
pelo motivo oposto, ou melhor, por terem cometido os assassinatos. Este
ano não está sendo muito diferente. Várias mortes já ocorreram, trocas
de tiros são frequentes, a qualquer hora do dia.
Recentemente, duas ocorrências ganharam
destaque: um rapaz de 22 anos foi encontrado na rua, morto. Cortaram-lhe
a língua, costuraram-lhe a boca e furaram-lhe os olhos. O mais terrível
é que, segundo relatos, a perícia constatou que esses detalhes sórdidos
foram praticados com a vítima ainda viva. Poucos dias depois (06/05), a
resposta veio com outra cena bárbara: em vingança, um rapaz fora
degolado e jogado num terreno baldio, de um lado o corpo, do outro a
cabeça.
A outra escola situa-se no bairro
Floresta, nos arredores da lagoa do Urubu. Lá, não é novidade quando
interrompemos nossas aulas por conta do barulho de tiros, muitas vezes
na frente da escola. Nós, professores, não podemos pegar o ônibus que
para bem do lado do colégio; vários professores já foram assaltados ou
sofreram tentativa de assalto, grupo em que me incluo; colegas já foram
até impedidos de trabalhar em determinado turno, por conta de ameaças.
Mas já tivemos dias piores. Final de
2011, por exemplo, por dois meses, acompanhamos uma sequência de mortes
de alunos e ex-alunos. Em 2012, passamos por vários sustos. De repente,
explosões de fogos de artifício faziam-nos crer que havia comício de
algum candidato. Na verdade, tratava-se de uma comemoração pela morte de
um desafeto; noutro dia mais fogos, e já sabíamos o motivo.
A abertura do ano letivo 2013, dia 26 de
março, foi interrompida e os portões fechados às pressas, por conta de
uma troca de tiros ocorrida na porta da escola. O porteiro apressou-se
em correr e fechar os portões. Depois continuamos, tensos, alguns
nervosos, todos imaginando no que poderia ocorrer no dia seguinte. O ano
estava apenas começando.
Caro jornalista, por medo decidi redigir
e enviar-lhe esse texto. Não o fiz por denuncismo nem com intenção de
ganhar destaque. Apenas senti a necessidade de publicizar a realidade
que todo professor da rede pública enfrenta no dia a dia. Uma realidade
que nos impõe medo, insegurança, doenças psicológicas e até o desejo de
abandonar o magistério”.
A COLÔNIA E A METRÓPOLE
Atenção: há um problema muito sério
relacionado aos serviços prestados pela Coelce. Um problema que
prejudica o crescimento econômico do Ceará, que atrapalha a geração de
empregos e que gera grandes prejuízos para a pequena, média e grande
iniciativa privada.
Qual é o negócio da Coelce? Vender
energia elétrica. Um grande e lucrativo negócio, além de um serviço
essencial. Não há uma nova residência, uma nova loja, uma nova sala
comercial, um novo prédio, um novo hotel, uma nova construção, um novo
shopping, uma nova lanchonete, uma nova casa de shows ou qualquer outro
negócio que prescinda da ligação de energia elétrica.
Tudo muito óbvio, não é? Porém, a Coelce
não está atendendo boa parte dos pedidos de novas ligações de energia
ou de redimensionamento de redes. Entenderam? Se um empreendedor vai
iniciar uma obra, não consegue ligar a energia para mover as máquinas.
Se um empreendedor pede a ligação de energia para fazer seu negócio
funcionar, também não está sendo atendido. É muito grave.
O problema se arrasta desde 2011. As
queixas junto à Arce se multiplicam. Foram 452 reclamações em 2011. 834
em 2012. Em 2013, o problema continua. Tanto que a Arce já ameaça pedir o
fim da concessão.
Mas, o que houve com a propalada
eficiência da Coelce? Em anos anteriores, a empresa se gabava da
qualidade de seu atendimento e do serviço que prestava. É óbvio que a
crise de agora tem forte relação com a falta de investimentos. A crise
é, portanto, de dinheiro.
A Coelce pertence à espanhola Endesa,
cujo 92% do capital pertence à italiana Enel. Especula-se que o que
acontece no Ceará seja reflexo da crise que afeta a Europa e, mais
propriamente, a Espanha e a Itália.
Trocando em miúdos, especula-se que o
dinheiro que deveria ser usado para investir em equipamentos e pessoal
para garantir a oferta de energia no Ceará está sendo sofregamente
sugado para a Europa. Conhecemos bem essa história desde o Brasil
colônia.
OBSCURIDADES
Muito estranha a demissão do major
Plauto do comando da guarda municipal de Fortaleza. O oficial de nossa
gloriosa Polícia Militar parecia fazer um bom trabalho no âmbito
municipal. Porém, o major pode ter começado a navegar em águas muito
revoltas ao declarar, em alto e bom som, que é simplório apontar o crack
como fator responsável pela escandalosa quantidade de assassinatos em
Fortaleza. Ao dizer isso, se contrapôs ao discurso oficial. Prossigamos.
Numa relação institucional com parâmetros nos tempos em que o prefeito
de Fortaleza era nomeado pelo governador, arranjaram uma maneira obscura
de demitir. No caso de Plauto, o major foi requisitado para voltar à
PM. A Prefeitura, sem questionar, acatou com imensa velocidade. O
distinto público, mais uma vez, fica sem saber o que de fato aconteceu.
"Durante o ano de 2012, tivemos 4 alunos
entre os 32 jovens mortos no bairro. Já outros dois ou três perdemos
por terem cometido assassinatos"
"A abertura do ano letivo 2013 foi
interrompida e os portões fechados às pressas por conta de uma troca de
tiros na porta da escola"
"Muito estranha a demissão do major
Plauto do comando da Guarda Municipal de Fortaleza. O oficial de nossa
gloriosa Polícia Militar parecia fazer um bom trabalho no âmbito
municipal".
municipal".
O POVO
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